Monday, February 18, 2008

traduçao caseira da lebre


Veste uma camisa limpa antes de morrer, disseram alguns russos.
Por favor, nada com baba, nódoas de ovo, sangue
suor , esperma.
Queres-me limpa, Deus,
por isso vou tentar obedecer.

O chapéu com que me casei,
servirá?
Branco, largo com um pequeno bouquet de flores falsas.
É antiquado, com tanto estilo como um percevejo,
mas fica bem morrer em algo nostálgico.


E vou levar
a minha bata de pintar
lavada vezes sem conta, claro
manchada com cada cozinha amarela que pintei.
Deus, não te importas que eu leve todas as minhas cozinhas?
Elas contêm o riso da família e a sopa.


Como soutien
(precisamos de o mencionar?)
O preto acolchoado que irritava o meu amante
quando eu o despia.
Dizia “para onde foi tudo?”

E levarei
a saia de grávida do meu nono mês
uma janela para a barriga do amor
que deixou cada bebé sair como uma maçã,
as aguas a rebentar no restaurante,
fazendo uma casa barulhenta onde eu gostaria de morrer.

Como roupa interior escolherei algodão branco,
as cuecas da minha infância,
pois era uma máxima da minha mãe
que as meninas boas apenas usavam algodão branco.
Se a minha mãe tivesse vivido para o ver
teria posto um cartaz de “Procura-se” nos correios
para as pretas, vermelhas, azuis que eu usei.
No entanto, seria perfeitamente agradável para mim
morrer como uma boa menina
a cheirar a Clorox e a Duz.
Tendo dezasseis-anos-nas-cuecas
morreria cheia de perguntas.



Anne Sexton



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Wednesday, January 23, 2008

tradução caseira da lebre

não mais as doces metamorfoses de
uma menina de seda
sonâmbula agora na cornija da névoa

o seu despertar de mão a respirar
de flor que se abre ao vento



Alejandra Pizarnik



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Monday, January 7, 2008

tradução caseira da lebre


O resto já te disse.
Uns quantos anos de fluência, e depois
o longo silêncio, como o silêncio do vale
antes das montanhas devolverem
a própria voz mudada para voz da natureza.
Este silêncio é agora a minha companhia.
Pergunto. De que é que a minha alma morreu?
E o silêncio responde

Se a tua alma morreu, de quem é a vida
que estás a viver?
E quando é que te transformaste nessa pessoa?


Louise Glück



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Thursday, January 3, 2008

Não, as palavras não fazem amor
fazem ausência
Se digo água, beberei?
Se digo pão,comerei?



Alejandra Pizarnik



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Tuesday, November 20, 2007

Todos os gestos do meu corpo e voz para fazer de mim a oferenda, o ramo que o vento abandona no umbral.



Alejandra Pizarnik


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Tuesday, September 11, 2007

tradução caseira da lebre


Andar não era suficientemente rápido, por isso corremos, correr não era suficientemente rápido, por isso galopámos. Galopar não era suficientemente rápido, por isso velejámos, velejar não era suficientemente rápido por isso rolámos felizes por longos carris de metal. Os longos carris de metal não eram suficientemente rápidos, por isso conduzimos. Conduzir não era suficientemente rápido, por isso voámos. Voar não é suficientemente rápido, não para nós. Queremos lá chegar depressa. Chegar onde? A qualquer sitio onde não estejamos. Costumam dizer que uma alma humana só pode ir tão rápido quanto um homem pode andar. Nesse caso, onde estão as almas todas? Deixadas para trás. Vagueiam aqui e ali, lentamente, luzes sombrias, tremeluzentes, de noite nos pântanos, à nossa procura, mas não são suficientemente rápidas, não para nós, estamos muito à frente delas, nunca nos apanharão. É por isso que nós podemos ir tão depressa? As nossas almas não nos pesam.



Margaret Atwood



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Thursday, September 6, 2007

Tu fazes o silêncio dos lilases que esvoaçam
na minha tragédia do vento no coração.
Tu fizeste da minha vida um conto para crianças
onde naufrágios e mortes
são pretextos de cerimónias adoráveis.




Alejandra Pizarnik



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